O coletivo Cassão surge do encontro de jovens fotógrafes que encontraram na arte um modo de resistência. Cansados de serem tratados como cassa, agora a cassa vai a cassa. Em 2018, de forma independe, o coletivo promoveu a exposição Escorpo. Além disso, Participou da leitura de portfólio do Festival QXAS e recentemente teve a pesquisa “Imargem - a fotografia insurgente de Fortaleza” aprovada no Laboratório de Pesquisa em fotografia do Centro Cultural do Bom Jardim.
Corpo Carcaça é a segunda exposição do Coletivo Cassão que agora convida outras 6 artistas para compor nosso espaço artístico. Trata-se de uma exposição foto videográfica que é um desdobramento das relações de investigação sobre si, é uma proposta de ocupação que versa a respeito e com os corpos que se transformam em suas metodologias de nado, capazes de desviar das estratégias de caça pautadas nas demandas sociais de precarização (e ao mesmo tempo de força) das corpas postas à margem. A exposição surge da inquietação quanto às questões de resistência na cidade de Fortaleza. Centrada a partir dos contra dispositivos do corpo, entendendo corpo também como território, destacando as marcas das violências diárias e discriminações, como também apontando para experimentações de defesa, experiências de combate e narrativas contra hegemônicas.
A curadoria teceu os trabalhos de uma forma que se conseguisse transmitir os estilhaços, as lascas, as belezas e firmezas que cada corpo que integra esse projeto traz consigo. Nesse sentido, pensa-se a imagem como formadora do corpo, nessa noção de corpo território expandido. A perspectiva, sobretudo, é pensar nas delicadezas e singularidades de pessoas que vivem conflitos causados por discriminações étnicas, de gênero, de classe e de outros espaços da existência. Apresentar outras narrativas de resistência/existência para corpos que se sentem presas, pautados não nas noções de luta estampadas socialmente (de maneira discriminatória) como “agressivas” ou “violentas”, mas pluralizando as formas de apresentação da imagem, operando também nas vias do sensível, do sutil, do não-representativo. O demonstrar próprio de nossas escamas e do que há entre elas, do fio de nossas espinhas e da cartilagem que nos envolve e torna possível sobreviver aos anzóis, aos arpões, às redes de pesca e captura. Capturar nós a nós mesmas, dessa vez, na imagem, o remexer suave das águas próximas ao nosso nadar, e o golfinhar próprio de nossas caudas.
Encontrar nos nossos espaços o que há de nós, buscar pelo conforto em quem somos e onde habitamos. A margem é, primeiramente, um local de existência. Aqui convivemos conosco e encontramos na borda uma maneira de viver sem espelhamento aos que se sentem ao centro. É na margem que existe espaço para expansão e é a partir das crescentes internas que conseguiremos ocupar toda a cidade. A margem é pele que tece, cresce, pluraliza e acolhe quem assume a dores e as belezas de ser quem se é.
É cura, entender os cortes em nossa pele-peixe, usar da imagem e do fazer em arte como uma possibilidade para continuar no mar, para continuar no nado, para tornar possível que nós engulamos oceanos.
O corpo enquanto espaço repleto de imagens múltiplas, imagens em guerra por seu território: território-fotografia-corpo, espaços negados a corpos postos à margem. O de ter e manter seu território a despeito das tentativas de desapropriação; a de ser sujeito da própria fotografia a despeito das iniciativas de captura e apropriação; a de construir e inventar corpo indo contra as políticas de encarceramento, de afastamento dos espaços de convívio social e das decisões micro e macropolíticas que repercutem sobre si mesmo. Corpo carcaça é intento, é propósito: é redundância para expor novamente o óbvio - vivemos, mesmo na tentativa de nos matar, e continuaremos vivendo e criando para denunciar políticas de extermínio (sutis ou não) e celebrar nossa existência.